Carta-protesto
Brasília, 22 de maio de 2018.
Exmo. Sr. Ministro da
Educação e Cultura da República Federativa do Brasil,
A APMCA vem, por meio desta,
expressar a nossa total indignação contra o contínuo e velado ataque aos
cidadãos de bem deste país. Estamos cansados de ser diariamente humilhados em
reuniões familiares, igrejas, bares e, mais recentemente, nas redes sociais.
Isso precisa acabar.
Sempre apoiamos a intensiva
campanha que este governo tem feito nos últimos anos contra o “bullying” nas
escolas. Reivindicamos agora um pouco de atenção para a nossa causa. Temos sido
surpreendidos e desmoralizados a todo o momento com novas regras e modas nas
formas de se conversar e escrever.
Estudos recentes comprovam que a constante e rápida
mudança no uso coloquial e ortográfico das palavras tem se tornado a maior causa
de ansiedade e depressão em adultos. Pesquisadores chineses afirmam que esse
pode ser o principal fator responsável pelo aumento do número de suicídios a
partir da quinta década de vida em todo planeta.
Não nos referimos aqui
aos inevitáveis dialetos profissionais de médicos, advogados e mecânicos. Nossa
queixa está no cotidiano. Um simples pedido de uma “média” na padaria da
esquina se tornou uma atividade embaraçosa. Ninguém nos compreende. É “pão na
chapa com pingado” ou nada é feito.
Nossos pais, já se
queixavam do desaparecimento dos saudosos ensinos primário, ginasial e científico.
Contudo, em muito menos tempo foram extintos os nossos “primeiro, segundo e
terceiro graus”. Sem qualquer período de transição, nos impuseram os termos
fundamental, médio e superior. Como podemos nos comunicar nas reuniões de pais e
mestres, quando mal sabemos em que nível de escolaridade estão nossos próprios
filhos?
Mesmo no esporte
preferido mudaram todas as posições. Entraram volantes, alas e líberos. Graças
a Deus ainda não mexeram nos zagueiros, mas como jogar sem pontas? Assistir
futebol nos bares tornou-se um constrangimento. Quando gritamos que foi “corner”, somos praticamente fuzilados
por olhares de reprovação de todos os jovens presentes. “Escanteio, tio. Foi escanteio”. Melhor ficar
em casa.
No JN, antigo Jornal
Nacional, “risco de vida” agora é “risco de morte”, favelas são comunidades,
negros são afrodescendentes e a simples palavra homossexual não define mais
coisa alguma. Nada contra o politicamente correto, porém o exagero é evidente. Esta
cada vez mais difícil esconder que nascemos nos anos 1960.
Isso sem falar nas esquizofrênicas
mudanças de ortografia. Temos verdadeiras crises de pânico quando precisamos do
hífen. O mandachuva deve usar guarda-chuva, mas tem que tomar cuidado
com o para-choque. Acentuar hiatos
tornou-se um risco de vida e morte. A saúva
continua a mesma, mas quem nasceu em Bocaiuva
está achando nossa língua uma feiura. Todas
as plateias sorriem de nossas ideias.
Perdemos completamente o
trema e a tranquilidade. Quase todos
acentos diferenciais foram abolidos. Isso mesmo: quase todos. Ora, ou se acaba
com tudo ou não. O “pára com isso” perdeu o acento e a força. Como pode se
escrever “como pôde” e ser compreendido? Vossa excelência precisa pôr
ordem nisso urgentemente.
Somos estrangeiros em
nosso próprio país. Caso nada seja feito, seremos a primeira geração de seres
humanos que passará a segunda metade da vida tentando esquecer o que conseguiu
aprender na primeira. Morreremos surdos, mudos e analfabetos.
Certos de poder contar
com vosso apoio, desde já, agradecemos pela atenção dispensada.
Associação dos Portadores de Mais de Cinquenta
Anos – APMCA.
Excelente a carta! Ainda estou no “quarenta”, mas falta pouco pros “cinquenta”, e sinto exatamente o mesmo 😣
ResponderExcluirObrigado, Claudia! Ficamos lisonjeados por você dividir seu segredo aqui conosco e estamos prontos para ajudá-la a enfrentar o que vem por aí.
Excluir