Café com leite

 


havia algo errado
com o garoto
seus olhos saíam do corpo
para filmar o que sentia

mas suas palavras
engatinhavam
mal ficavam de pé
estavam verdes

quando escrevia
de barriga cheia
golfava leite talhado
nas páginas do caderno

o papel só aceitava
banana amassada
e maçã raspada
não tinha dentes

passava as tardes 
no banco do parquinho
decifrando a coruja
que lhe vigiava

queria escrever sobre
árvores e passarinhos
mas a nitidez ofuscava
faltava miopia

um dia enxergou
guarda-chuvas
se espreguiçando
pelas ruas

saiu carregando
suas janelas pela cidade
parava debruçava e escrevia
criou vício em metonímias

não levava rimas à sério
e descobriu sozinho
que métrica é música
e que poesia é sexy

não era tão bobo
quanto parecia
era café-com-leite
mas era poeta

Comentários

  1. Espetacular! Moisés, definitivamente, você é poeta! Gostei demais, especialmente do "vício em metonímias"! Parabéns!

    ResponderExcluir
  2. Que legal muito bom de ler 👏🏻👏🏻

    ResponderExcluir
  3. Excelente! Mas restou uma pergunta: café-com-leite aonde, com esse tanto de poesia?

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Por quê?

Relíquia

Cinzas acesas